Rede Social – Reconhecimento

Abr 22, 2021 | Regulação Municipal

Resolução do Conselho de Ministros n.º 197/97, de 18 de novembro – “Rede Social – Reconhecimento”

Procede ao reconhecimento público da denominada “rede social”.

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Resolução do Conselho de Ministros n.º 197/97

Existe no País uma secular e fecunda tradição de entreajuda familiar e de solidariedade mais alargada. Aí radicam inúmeras instituições particulares. A própria iniciativa económica empresarial provém, até certo ponto, deste mesmo lastro ancestral, designadamente no que se refere às pequenas unidades produtivas de base familiar.
Para além das instituições, existem inúmeros grupos e iniciativas de acção social disseminados por todo o País. E, na base do quadro institucional, encontram-se as múltiplas relações de entreajuda na família, na vizinhança, na área de residência, na vida profissional, cultural e desportiva e no associativismo em geral.
Regista-se, assim, um vasto espectro de redes de solidariedade que a política social não poderá descurar, sob pena de alienar a sua força vital. Dir-se-á até que uma primeira medida de política social consiste no reconhecimento das redes de solidariedade que a antecedem, respeitando a sua identidade, potencialidades e valores intrínsecos.
Indício da dinâmica destas iniciativas tem sido o constante crescimento do número de instituições do sector social e o progressivo alargamento da sua obra, integrando em todo o País uma verdadeira rede de solidariedade e protecção social.
A presente resolução tem, assim, como objectivos fundamentais efectuar o reconhecimento público da identidade e valores desta realidade, fomentar a formação de uma consciência colectiva e responsável dos diferentes problemas sociais que atende e incentivar redes de apoio social integrado de âmbito local, contribuindo, através da conjugação de esforços das diferentes entidades locais e nacionais envolvidas, para a cobertura equitativa do País em serviços e equipamentos sociais.
A rede social é um fórum de articulação e congregação de esforços e baseia-se na adesão livre por parte das autarquias e das entidades públicas ou privadas sem fins lucrativos que nela queiram participar. A rede social deverá, no entanto, assumir uma postura activa de ir ao encontro das diferentes entidades que actuam no domínio social, suscitando a sua participação.
Espera-se deste modo que, sem a criação de novos organismos nem aumento, significativo, de despesas, se fomente a solidariedade social, se optimizem as diferentes capacidades de resposta e se adaptem, com base nessa dupla dinâmica, as novas medidas de política social que se vão tornando necessárias e possíveis. A rede social poderá contribuir decisivamente para a consciência pessoal e colectiva dos problemas sociais, para a activação dos meios e agentes de resposta e para as inovações recomendáveis.
Na sequência do ano dedicado à «erradicação da pobreza», vale a pena convidar toda a sociedade portuguesa e, em especial, as entidades que actuam neste domínio a intensificarem e concertarem os seus esforços, em ordem à optimização possível dos meios de acção.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolveu:
1 – Designa-se por rede social o conjunto das diferentes formas de entreajuda, bem como das entidades particulares sem fins lucrativos e dos organismos públicos que trabalham no domínio da acção social e articulem entre si e com o Governo a respectiva actuação, com vista à erradicação ou atenuação da pobreza e exclusão social e à promoção do desenvolvimento social.
2 – Atento o que se refere no número anterior, a rede social constitui um dispositivo de congregação de esforços, não resultando da presente resolução a alteração de estruturas orgânicas nem a alteração da legislação em vigor.
3 – Eventuais alterações de estruturas orgânicas e de legislação poderão surgir a partir de propostas formuladas no âmbito da rede social.
4 – Considera-se desejável que a congregação de esforços, referida no n.º 2, tenha lugar a nível tão próximo quanto possível do local em que se registam os problemas sociais, começando pela freguesia, e ainda que aí existam os meios de solução possíveis.
5 – Na medida em que tais meios não existam a nível de freguesia, os problemas que aí não obtenham solução adequada serão encaminhados para outros níveis de actuação e decisão.
6 – A acção social, a que se refere o n.º 1, abrange, nomeadamente, as actividades relativas a:
a) Famílias, crianças, jovens e idosos; pessoas portadoras de deficiência;
b) Jovens e adultos em situação de grande dependência;
c) Pessoas afectadas pela toxicodependência e pelo vírus HIV;
d) Pessoas em situação de marginalização ou marginalidade; fomento da economia social;
e) Animação sócio-local.
7 – É desejável que a rede se desenvolva desde o âmbito local ao nacional, fomentando actuações tão integradas quanto possível.
8 – No âmbito da freguesia, consideram-se particularmente recomendáveis as seguintes actividades, a realizar pelas instituições e grupos de acção social que aí actuem:
a) Contacto directo com as pessoas e famílias em situação de maior carência;
b) Despistagem de situações tipo, distinguindo em especial as que se podem resolver através do trabalho ou formação profissional e as que implicam outras vias de solução;
c) Cooperação activa com as pessoas e famílias abrangidas, designadamente através da informação, da motivação, do encaminhamento e acompanhamento para efeitos de superação das suas dificuldades e do acesso a serviços e a prestações sociais;
d) Apresentação à comissão social de freguesia, a que se refere o número seguinte, dos problemas que precisem da respectiva intervenção, juntando as propostas tidas por adequadas;
e) Elaboração de estatísticas das situações atendidas e do respectivo encaminhamento.
9 – A comissão social de freguesia é composta pelo presidente da junta que, em princípio, preside e por representantes das entidades particulares sem fins lucrativos interessadas e de organismos da administração pública central implantados na mesma área.
10 – Incumbe às entidades – públicas e privadas – reunidas em comissão social de freguesia, nomeadamente:
a) A dinamização e articulação das entidades referidas no número anterior;
b) A apreciação dos problemas e propostas de solução que lhe sejam apresentados, por aquelas mesmas ou por outras entidades, e a procura das soluções necessárias mediante a participação de entidades representadas, ou não, na comissão;
c) O encaminhamento para o conselho local de acção social, a que se referem os n.os 11 e 12, dos problemas que precisem da respectiva intervenção, juntando as propostas que tiverem por adequadas;
d) A elaboração e difusão de estatísticas dos problemas que lhes sejam apresentados e do respectivo encaminhamento;
e) A promoção de colóquios e iniciativas afins, visando a melhor consciência, pessoal e colectiva, dos problemas sociais, o empenhamento na respectiva solução e a partilha de responsabilidades.
11 – O conselho local de acção social é composto pelo presidente da câmara municipal que, em princípio, preside e por representantes das entidades particulares sem fins lucrativos interessadas e de organismos da administração pública central implantados na mesma área.
12 – Incumbe às entidades – públicas e privadas – reunidas em conselho local de acção social, recorrendo aos serviços de acção social autárquicos, quando instituídos, nomeadamente:
a) A dinamização e articulação das comissões sociais de freguesia, sobretudo nas zonas afectadas por problemas sociais de maior gravidade;
b) A apreciação dos problemas e propostas que sejam apresentados pelas comissões sociais de freguesia, ou por outras entidades, e a procura das soluções necessárias mediante a participação de entidades representadas, ou não, no conselho, designadamente os serviços autárquicos de acção social;
c) O encaminhamento, para os centros regionais de segurança social, dos problemas que precisem da respectiva intervenção, juntando as propostas que tiverem por adequadas;
d) A emissão de parecer sobre a cobertura equitativa e adequada do concelho por serviços e equipamentos sociais;
e) A análise e esforços tendentes à eliminação de sobreposições e lacunas de actuação;
f) O conhecimento de protocolos e acordos celebrados entre o Estado, autarquias, instituições de solidariedade social e outras entidades que actuam no domínio social;
g) A elaboração e difusão de estatísticas dos problemas que lhes sejam apresentados e do respectivo encaminhamento;
h) A promoção de iniciativas do teor das previstas na alínea e) do n.º 10, visando os mesmos objectivos;
i) O fomento da articulação entre os organismos públicos e entidades privadas que actuam no domínio social na área do concelho, visando, em especial:
ii) A actuação concertada na prevenção e solução de problemas sociais;
iii) A adopção de prioridades.
13 – Para efeitos do disposto na alínea b) do número anterior e para se limitar ao mínimo o encaminhamento previsto na alínea c) do mesmo número, poderão ser celebrados contratos-programa de desenvolvimento com as autarquias e ou outras entidades integrantes da rede, prevendo os necessários meios financeiros.
14 – Entre os organismos públicos, a que se referem os n.os 9 e 11 e a alínea i) do n.º 12, incluem-se particularmente os do âmbito dos Ministérios da Solidariedade e Segurança Social, para a Qualificação e o Emprego, da Educação, da Saúde e da Justiça.
15 – Salvaguardando a actuação atribuída aos níveis autárquicos e às instituições particulares das respectivas áreas geográficas, nos termos previstos nos n.os 8 a 12, os centros regionais de segurança social desenvolverão todos os esforços que tenham em vista:
a) A solução dos problemas que lhes sejam apresentados pelos conselhos locais de acção social, diligenciando envolver todas as entidades públicas e privadas que para a mesma possam contribuir;
b) O encaminhamento para a comissão de cooperação social, a que se referem os n.os 18 a 22, da informação relativa aos problemas que precisem da respectiva intervenção, juntando as propostas tidas por adequadas;
c) A elaboração e difusão de estatísticas;
d) A promoção de iniciativas do teor das previstas na alínea e) do n.º 10, visando os mesmos objectivos.
16 – Os centros regionais de segurança social actuarão em estreita cooperação com os respectivos conselhos sub-regionais e regionais, particularmente no que se refere à apreciação de propostas de medidas e à procura de participação na solução dos problemas apresentados pelos conselhos locais de acção social.
17 – Tendo em atenção o que se encontra previsto no número anterior, poderá vir a ser revista a legislação referente aos conselhos aí mencionados.
18 – Junto do Ministro da Solidariedade e Segurança Social funcionará a comissão de cooperação social, composta por representantes dos ministérios referidos no n.º 14, das autarquias locais e das organizações de âmbito nacional representativas das entidades sem fins lucrativos que actuam no domínio social.
19 – Incumbe às entidades – públicas e privadas – reunidas em comissão de cooperação social, nomeadamente:
a) A dinamização e articulação dos conselhos locais de acção social, sobretudo nas zonas afectadas por problemas sociais de maior gravidade;
b) A apreciação dos problemas e propostas que lhes sejam apresentados pelos centros regionais de segurança social, com base no trabalho dos conselhos locais de acção social e das comissões sociais de freguesia, e a procura das soluções necessárias;
c) A apresentação ao Governo, através do Ministro da Solidariedade e Segurança Social, de propostas de medidas de política, ou de outras iniciativas, baseadas na procura de soluções para os problemas em aberto e tendo em conta as propostas que lhes tenham sido apresentadas;
d) Elaboração e difusão de estatísticas;
e) A realização de iniciativas do teor das previstas na alínea e) do n.º 10, visando os mesmos objectivos.
20 – Pelo menos duas vezes por ano, a comissão de cooperação social reúne em conjunto com os membros do Governo mais directamente responsáveis pelas áreas onde se situam os problemas sociais em aberto, tendo em vista:
a) A apreciação desses problemas, das perspectivas de solução e das propostas pendentes;
b) A assunção de compromissos;
c) A preparação de comunicações destinadas às entidades que integram a rede, às pessoas que vivem os problemas abordados e à população em geral.
21 – As autarquias locais terão a iniciativa de promover a criação dos conselhos locais de acção social e das comissões sociais de freguesia, sem prejuízo de ser suscitada por qualquer entidade susceptível de os integrar, que actue na respectiva área geográfica, nem das diligências previstas nas alíneas a) dos n.os 12 e 19.
22 – A comissão de cooperação social bem como os conselhos e comissões referidos no número anterior elaboram e aprovam os seus regulamentos internos, nos moldes que tiverem por convenientes.
23 – Os órgãos referidos no número anterior não constituirão duplicação de quaisquer outros, nomeadamente das comissões locais e da comissão nacional do rendimento mínimo garantido, sendo por isso recomendável que, no plano local e no nacional, sejam tomadas as providências de integração tidas por adequadas, e podendo vir a adoptar-se, mais tarde, orientações de carácter geral baseadas na experiência decorrida entretanto.
24 – Os órgãos referidos no n.º 21 tomarão as providências adequadas para a circulação de informação, incluindo a respeitante a decisões tomadas.
25 – As actuações desenvolvidas no âmbito da rede orientam-se pelos seguintes princípios:
a) Atribuição de prioridade às pessoas e grupos sociais atingidos pela pobreza ou exclusão social;
b) Participação das pessoas e grupos abrangidos e das populações em que se inserem;
c) Fomento e facilitação, nessas mesmas pessoas e grupos, do espírito e da prática da iniciativa;
d) Subsidiariedade activa, não transferindo para instâncias de âmbito mais amplo o que pode ser resolvido nas de âmbito mais reduzido e, por outro lado, não recusando a estas todo o apoio possível;
e) Parceria, cooperação e partilha de responsabilidades entre as várias entidades, públicas e privadas, envolvidas nos processos de diálogo e de procura de soluções;
f) Actuação nas manifestações e nas causas dos problemas detectados;
g) Conciliação e complementaridade entre o tratamento personalizado de cada situação, efectuado sobretudo nas instituições e grupos de acção social directa, e o tratamento da informação, estatística ou outra, que se torne necessário para efeitos de conhecimento geral e de adopção de medidas;
h) Integração das diferentes perspectivas dos problemas e vias de solução, articulando em particular as de índole social, de emprego-formação, de carácter económico e cultural;
i) Informação e transparência tão completas quanto possível;
j) Gratuitidade do serviço de participação nos órgãos referidos no n.º 21, sem prejuízo da compensação de despesas, cujo financiamento é assegurado pelas verbas da acção social.
26 – Mediante despacho do Ministro da Solidariedade e Segurança Social ou despacho conjunto, conforme as áreas a abranger, com os ministros da tutela, será regulamentada, após auscultação, a presente resolução, nomeadamente em matéria de formação de agentes e de recolha, tratamento e difusão de informação.

Presidência do Conselho de Ministros, 23 de Outubro de 1997. – O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.